I


Penetrando as lentes embaçadas da timidez, o negro marcado dos olhos dela mergulhou nos seus indefesos cor de mel e com o calor de uma brasa ardente derreteu as trancas do seu coração. Embaixo da capa antiquada, ela descobriu uma usina de sonhos alimentada pela ilusão, que se mantinha produtiva apesar da realidade. Os lábios vermelhos dela riam-se da inocência das palavras dele que, apesar de belas, eram frágeis demais. Indiferente ao seu descrédito, ele ocupava-se de aproveitar a oportunidade de ser, para ela, algo mais que superficial. Indiferente ao esforço, ela ocupava-se de expor as falhas dos seus planos e de destruir o castelo de cartas ilusórias em que ele depositou sua crença na felicidade. Os calos do coração dele fizeram-no querer lutar por um amor verdadeiro. Os calos do coração dela fizeram-na costumar-se à amargura da solidão. Enquanto ele adoçava a sua vida com poesias, ela embriagava-se com o fel da desilusão, enquanto ele a presenteava com gestos apaixonados, ela o agredia com uma sinceridade impiedosa. Com pétalas de rosas ele toca seu corpo, com os espinhos ela faz do prazer uma diversão passageira. Ele a encanta, ela o seduz, ele sonha e ela o acorda, ele quer a luz do dia e ela a noite perigosa, ele quer o altar e ela quer a cama. Ele quer a certeza do amanhã e ela a intensidade do agora.


Maria

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Sobre este blog

“Nós que não estamos aqui só a passeio...” Temos um árduo caminho a percorrer. Um caminho cheio de altos e baixos, cheio de desafios, de obstáculos, de alegrias e descobrimentos. O caminho leva ao sacrifício que muitas vezes implica em solidão. Mas, envolvidos em uma atmosfera inebriante, buscamos o que nos move: amor, paixões, sonhos... não importa. Iniciamos o processo, seguimos o caminho e ao longo dele nos deparamos com outros que também estão em busca de si. É assim que começamos a dividir, conhecer, acrescentar, compartilhar... experiências, momentos, vidas e prosas.

Maria de Beauté


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